16 de mar. de 2011

Análise crítica dos requisitos e forma de investidura dos ministros do STF



Conta-nos a história que por se tornar dificultosa a remessa dos agravos ordinários e das apelações para a Casa da Suplicação de Lisboa (órgão de última instância), decidiu o Príncipe D. João, por meio de alvará de 10 de maio de 1.808, que a Relação do Rio de Janeiro seria transformada em Casa de Suplicação do Brasil, prevendo: “I – A Relação desta cidade se denominará Casa da Suplicação do Brasil, e será considerada como Superior Tribunal de Justiça para se findarem ali todos os pleitos em última instância, por maior que seja o seu valor, sem que das últimas sentenças proferidas em qualquer das Mesas da sobredita Casa se possa interpor outro recurso, que não seja o das Revistas, nos termos restritos do que se acha disposto nas Minhas Ordenações, Leis e mais Disposições. E terão os Ministros a mesma alçada que têm os da Casa da Suplicação de Lisboa. (...)”.
Com aquele ato o Príncipe inaugurava no Brasil o modelo da atual Suprema Corte que apesar de ter sofrido várias alterações em sua nomenclatura, composição, sua função de servir como última instância permaneceu, ganhando outras de extrema relevância.
O Supremo Tribunal Federal, doravante denominado apenas de STF, é, hodiernamente, órgão de cúpula do Poder Judiciário e guardião da Constituição, conforme delineou nos artigos 92, I e 102, da Carta Política de 1988, o poder constituinte originário.
Assim como nos primórdios, modernamente, o STF, per si, atrai olhares críticos. Notadamente, esse fato decorre de suas atribuições, mormente a de interpretar a Constituição.     
Dos aspectos deste Tribunal Supremo serão postos em análise aqueles que atinem aos requisitos e à forma de investidura no órgão.
Os requisitos para ser ministro são quatro: ser cidadão brasileiro nato; ter idade maior de 35 e menor de 65 anos; ter notável saber jurídico e reputação ilibada. Uma indagação surge logo de plano com relação à subjetividade dos dois últimos requisitos. Em que pese parecerem ser objetivos os requisitos, pois o artigo faz uso de palavras categóricas como notável e ilibada, não o são.
O que é notável e ilibado para um pode não ser para outro. Diga-se de passagem, para muitos, ter sofrido condenação judicial civil ou criminal não torna a pessoa inidônea, no entanto, para outros muitos, esse critério é tido como premissa, principalmente para admissão em não poucos cargos públicos. O que é notável saber para um grupo, devido a uma mesma leitura que fazem de determinado conceito ou por compartilharem da mesma ideologia, pode ser verdadeira aberração para outros tantos grupos que por caminhos diferentes chegaram às suas conclusões. Em contrapartida, há alguns que se deixam levar por apenas um bocado de proposições silogísticas que transmutam mentiras em “verdades”.
                A aludida subjetividade não seria um problema se nós não estivéssemos falando da condição pessoal daqueles que integrarão o Tribunal Superior ou, o Superior dos Tribunais. Fato é que tal amplitude na conceituação dos requisitos de investidura viabiliza a discricionariedade por parte do agente responsável pela indicação, discricionariedade essa que poderá servir de álibi para arbitrariedade e imoralidade na administração que contamina, via de conseqüência, todo o sistema.
Tanto o Poder Executivo quanto o Poder Legislativo têm seus agentes políticos investidos por meio de eleição, seja ela majoritária ou proporcional. Ao passo que o Poder Judiciário se vale de concurso público para investidura na primeira instância, com a devida promoção por antiguidade e merecimento para a segunda instância. Contudo, a investidura nos Tribunais Superiores incluindo o Superior Tribunal se dá de forma diversa. Sendo a do STF a que mais nos interessa.
 O ingresso como ministro do STF, vencida a etapa da aferição das condições pessoais, é feito por nomeação, após ser o indicado “sabatinado” pelo Senado Federal e aprovado por maioria absoluta de votos. O Poder que exerce a função executiva, por intermédio de seu chefe, é quem tem competência (leia-se prerrogativa) para fazer a nomeação do cidadão que pretenderá ser ministro da Corte.
 Com relação a este aspecto pergunta-se: tal competência não feriria o princípio da separação dos poderes? Sem pretender esgotar o assunto nem tampouco formar opinião dos leitores, mas apenas fomentar um raciocínio crítico por parte dos cidadãos, abordaremos a questão.
Não obstante o STF ser um Tribunal aparentemente político, frise-se político não partidário, pois determinadas interpretações e decisões suas demonstram isso, ele é um órgão do Poder Judiciário. Tipicamente, tal poder não toma decisões políticas, em respeito ao princípio da separação dos poderes, sendo-lhe reservada a função de julgar. Cabe, portanto, ao Executivo e ao Legislativo a referida função política. O raciocínio anterior se faz pertinente na medida em que nos permite identificar a atuação de cada poder e segregá-los.
Quando o Poder Executivo nomeia e o Senado Federal aprova o indicado para compor o STF, há interferência direta dos dois poderes no outro. Isso pode, dada a falibilidade acentuada de alguns humanos, influenciar nos votos dos ministros, fazendo com que ao invés de decisões técnicas de homens comprometidos com o direito e a justiça, bem como com a guarda da Constituição, suas decisões sejam políticas por essência e influência e não por eventualidades. Tal fato mitiga o princípio fundamental do Estado de Direito.
Somados o critério subjetivo da escolha dos ministros e a interferência que a cúpula do Judiciário sofre, entendemos que o poder constituinte originário não teve muito esmero na questão em xeque, cabendo ao poder reformador tentar fechar esta brecha. Para tanto, poderá iniciar processo legislativo, capaz de inserir no corpo da Carta Magna, espécie normativa primária denominada emenda à Constituição (PEC). Algumas propostas já foram editadas, tais como a PEC nº. 473/200; 434/2009; 441/2009, entre outras. Cada uma delas propõe comandos distintos.
As referidas propostas podem ser consideradas um avanço, se consideradas sob o prisma da insatisfação que leva à  busca pela real democracia. Podem, ainda, ser consideradas um retrocesso, se consideradas sob a perspectiva da busca pela alternância ilegítima de poder. Espera-se, pois, que cada Casa do Congresso Nacional aprove e promulgue a proposta que observe os princípios Constitucionais e que se amolde ao Estado Democrático de Direito como se pretende a República Federativa do Brasil. 

Por: Dcª Grazielle Adversi (Advogada)